Oficina de Arte e Ativismo debate raça e etnia na arte

Todas as quartas-feiras à tarde há muita conversa, prosa e criação no ateliê de arte da Casa OPOCA movimentado pela Oficina de Arte e Ativismo, ação mediada pela artista e educadora Débora Fernandes. Durante todo o ano temas como racismo, feminismo, ativismo político, LGBTQIA+, dentre outros são discutidos através da arte e de coletivos artísticos e culturais.

O tema dos encontros de agosto foi Raça e Etnia na Arte. A primeira referência para iniciarmos o debate foi a vídeo-performance Transmutação da Carne do artista baiano Ayrson Heráclito. A obra denuncia a terrível prática de marcar/machucar a pele e a alma de pessoas negras escravizadas no século XVI. Debatemos, também, outros artistas como Tiago Gualberto que revisa e problematiza as expressões racistas que estão no nosso cotidiano desde o período da escravização, como: “coisa de preto”, “ovelha negra”, “criado mudo”, “mulata”, etc. O artista imprime essas frases sobre filtros de café criando uma sobreposição com gravura de rostos de pessoas negras. No formato instalação, o espectador retira um filtro de dentro do outro sendo provocado a pensar que atrás destas expressões racista há o corpo e a alma de um sujeito negro/a. Abaixo, acessamos as gravuras com rostos de sujeitos negros/as impressos em filtros de café criados pelo coletivo da oficina.

Na Oficina de Arte e Ativismo, focalizamos, também, produções de artistas indígenas, como Gustavo Caboco que cria gravuras exaltando as relações entre comunidades indígenas e suas terras de origem, suas ancestralidades e suas conexões com a natureza. Dialogamos sobre a série Amazônia de Jaider Esbell que reflete acerca do avanço industrial sobre a floresta e territórios indígenas. Vimos Carta ao velho mundo de Esbell, onde o artista revisa livros sobre a história do Brasil mostrando-nos que a história tradicional de que o Brasil foi descoberto pelos europeus apaga a existência e narrativas dos povos indígenas que já viviam aqui. Nesse sentido, o artista apresenta outra narrativa histórica onde os povos originários são os protagonistas, estes, já estavam nesse território muito antes de qualquer caravela chegar pelo Atlântico. Após dialogarmos acerca destes acervos, o coletivo da oficina realizou uma intervenção com colagem e desenho sobre uma enciclopédia antiga reformulando a história através da arte, criaram páginas com o protagonismo de caciques e xamãs indígenas, senhoras-avós e crianças indígenas, os povos originários como os primeiros habitantes desse solo. Além disso, destacou-se entre os grafismos dos trabalhos a pauta essencial da luta indígena: “Demarcação Já”.

No dia 19 de agosto, sexta-feira à tarde, houve a montagem da terceira exposição com os trabalhos da Oficina de Arte e Ativismo. Expusemos os trabalhos de agosto, são eles: os rostos negros em filtros de café e as páginas revisadas da enciclopédia histórica.

No dia 24 de agosto, na Oficina de Arte e Ativismo, recebemos uma convidada super especial para aprofundar o debate sobre a proteção da floresta e ativismo ambiental, Beatriz Beisiegel é bióloga e pesquisadora no Parque Estadual Carlos Botelho há mais de 20 anos. Bia nos contou sobre a vida na floresta através de seus objetos de pesquisa, o cachorro do mato e a onça pintada, detalhou sobre os modos de vida desses seres, como eles vivem na floresta, como eles se tornaram alvo de caça e como eles vem correndo riscos frente ao tráfico de animais silvestres e avanço do garimpo e desmatamento na floresta. Vimos diversos vídeos e fotos captados pela pesquisadora, percebemos que ela acompanha um animal em todo o seu ciclo de vida observando diariamente os seus rastros na floresta. Após a conversa, a proposição prática foi a criação de uma carta endereçada à terra, onde o coletivo da oficina fez uma mensagem de conscientização à nossa vasta natureza.

No dia 26 de agosto houve uma ação de extensão da Casa OPOCA na Escola Nestor Fogaça. Nos reunimos, um grupo de oito pessoas da Oficina de Arte e Ativismo, alguns da Escola Arrivabene, outros da própria Nestor mais o Grêmio Estudantil da escola (composto por 9 pessoas) para um momento de partilha dos trabalhos de arte feitos na oficina até o presente momento. A primeira proposta de intervenção dentro da Escola Nestor Fogaça foi sugerida pelo grupo da Oficina de Arte e Ativismo, criamos, portanto, uma dinâmica de diálogo acerca do que é preconceito de raça/gênero/classe e como combater estes no ambiente escolar. Cada integrante da oficina falou do seu próprio trabalho mostrando-o e contando sobre as reflexões envolvidas. Houve professoras assistindo com questões e comentários muito pertinentes. Na sequência, alguns xerox de cartazes foram colados no corredor da escola.

No dia 31 de agosto (quarta-feira), na Casa OPOCA, recebemos outro convidado admirável, o fotógrafo documentarista e produtor artístico Celso Santos de Itapetininga/SP. Diretor de Comunicações da Mandinga Produções Artísticas e Consultor de Comunicações do Núcleo de Cultura Afro-Brasileira da UNISO, Celso nos contou em detalhes o que é a fotografia documental e como essa linguagem se caracteriza enquanto ferramenta política e de crítica social nos ativismos urbanos atuais, sobretudo, na luta racial negra e indígena. 

Conhecemos uma série de artistas e coletivos de fotógrafos e filmes apresentados por Celso, como: Antimídia, Michele Minerbo, Juliana Pacheco, Sebastião Salgado e Matheus Alves. Além de conhecer diversos trabalhos do próprio artista que já fotografou eventos, coletivos culturais e mobilizações sociais em diversas cidades do interior do estado de São Paulo e, também, manifestações sociais na capital, com destaque ao ato pela vida de Moïse Kabagambe, um jovem negro congolês de 24 anos que veio para o Brasil como refugiado político com a mãe e os irmãos em 2014 e foi assassinado na Barra da Tijuca/RJ ao cobrar o pagamento atrasado de serviços feitos em quiosque da praia. Celso participou da mobilização pela vida de Moïse na Avenida Paulista em São Paulo efetivando um acervo de fotografias muito potentes e reflexivas, as quais chamou a atenção do coletivo da oficina. 

A conversa foi riquíssima, pois os nossos jovens puderam conhecer na prática o que é fotografia documental que efetiva um projeto de arte política. Na sequência, Celso compartilhou a sua proposição prática que foi sair pelas ruas da cidade em busca de ângulos precisos para fotografias documentais. Celso estendeu um tempo de duas semanas para o grupo enviar suas fotos documentais no drive OPOCA, as quais serão tema de uma outra oficina de colagem. Confira os registros da caminhada fotográfica.

Assim fechamos o vasto agosto com os tantos movimentos apresentados nessa news. Foi muito gratificante e satisfatório reviver as ações do OPOCA nessa escrita.

Um abraço, Débora.

Débora Fernandes

Débora Fernandes é artista-educadora, pesquisadora e fotógrafa. Mestranda em História da Arte pela Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP) e formada em Artes Visuais pela Universidade Estadual de Londrina (2017). Media a Oficina de Arte e Ativismo e é responsável pela Comunicação e Artes Visuais do OPOCA.

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