Cozinha Caipira, resistência cultural

A culinária caipira traz consigo valores comunitários, solidários, de mobilização social, que nos interliga aos tempos antigos, das práticas culturais do fazer junto, do descascar as batatas em roda, de ralar o milho, das conversas e trocas ao redor das panelas quentes, do comer em grupo numa mesa grande. Em muitos casos, essa prática ocorre com a intenção de ajudar alguém ou alguma causa: a comunidade, a igrejinha do bairro, a associação de moradores, uma pessoa que está passando por alguma dificuldade, etc.  

Encontro de Culinária Caipira na Casa OPOCA com Cida Fernandes.

A realização de uma receita envolve técnicas e conhecimentos próprios que podem se constituir em referências culturais para determinado grupo.

O saber-fazer bolinho de frango, Mingau de milho verde, Paçoca de carne, Virado de frango, entre outras iguarias existentes em nosso município, envolvem técnicas e matérias primas que dizem muito sobre o meio ambiente e o modo como as pessoas interagem com ele. Por exemplo, o milho, a farinha de milho, o frango, o cheiro verde, a batata, são elementos característicos de nosso cotidiano. Estão intimamente ligados com outras práticas cuturais, como a época de colheita do milho ou alguma festividade da cidade, a atividade coletiva de ralar o milho ou de matar e limpar o frango.

Encontro de Culinária Caipira na Casa OPOCA com Cida Fernandes.

Esse tipo de saber, mesmo não sendo valorizado pelas políticas públicas culturais como deveria ser, está enraizado em nossa cultura e majoritariamente nas mãos de mulheres que transmitem os seus conhecimentos de geração para geração, promovendo um ato de resistência cultural capaz de manter e desenvolver a riqueza da cultura caipira local, por mais que essa função não seja tão clara, necessariamente, para quem a pratica, e mesmo que o objetivo principal dessas mulheres não seja este.

Encontro de Culinária Caipira na Casa OPOCA com o Chef Júnior do Grupo D’ama de Campinas.

Para a transmissão desses saberes, que depende unicamente de que as pessoas continuem repassando os seus conhecimentos, é preciso que sempre haja grupos distintos de pessoas aprendendo para que se mantenham vivas as referências culturais. A promoção de espaços, recursos e incentivos a esse tipo de prática são importantes para que o município desenvolva, inclusive, uma economia local mais forte, descentralizada e sustentável porque pautada na sua potencialidade e originalidade cultural.

Maria José prepara todas as terças-feiras pães caseiros para venda na Casa OPOCA.

Dessa forma, as práticas de cozinha caipira que ocorrem no Ponto de Cultura Casa OPOCA têm essa missão de ser um espaço em potencial para que, não apenas a técnica, mas os saberes e os valores comunitários, solidários e de mobilização social que acompanham as suas práticas sejam passados adiante e sigam nos fortalecendo coletivamente. 

Júlia Marques Galvão

É Diretora Cultural do Opoca e Mestra em Gestão e Programação de Patrimônios Culturais pela Universidade de Coimbra, Portugal. Formada em Turismo pela Universidade Federal de São Carlos (UFSCar). Possui trajetória com experiências em gestão e programação de projetos culturais, ambientais e educacionais durante toda a sua vida profissional. Se dedica a estudos, vivências e ações sobre temas como feminismos, cultura e racismo.

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