Introdução
A humanidade atravessa uma crise sem precedentes movida pelo modo de vida moderno e os seus alicerces culturais, políticos, econômicos e sociais. A vida na Terra enfrenta desafios difíceis de serem superados enquanto não houver forças coletivas, populares, artísticas, culturais, políticas, econômicas, científicas capazes de fazer frente a esses desafios e aos poderes que os produzem.
Superar as ameaças aos ecossistemas está entre as tarefas mais urgentes. As mudanças climáticas, a perda de biodiversidade, a degradação do solo, a poluição do ar e da água, o envenenamento por agrotóxicos, dentre outras consequências diretas de como a sociedade moderna interage com o meio ambiente está ameaçando a sustentabilidade do planeta e a sua capacidade de suportar a vida humana e outras espécies.
A cultura do consumo insaciável e da produção de bens materiais supérfluos, atrelada ao uso dos combustíveis fósseis e ao desmatamento, em função do acúmulo também insaciável de capital, estão entre as raízes desses problemas e produzem, para além das catástrofes ecológicas, as catástrofes na vida humana, comunitária e cotidiana.
A desigualdade social e econômica que se amplifica de maneira obsena para a concentração da riqueza global, ainda na terceira década século XXI, é o produto de modelos político-sócio-econômicos que se apropriam e reproduzem uma distribuição desigual de recursos, de meios de vida e de meios de produção, impondo a comunidades locais, periferias e suas populações, o trabalho estrutural porém precarizado de sua economia, a miséria, o abandono puro, a força policial e as violências que geram as mais dramáticas formas de sofrimentos humanos em seu seio, principalmente às suas crianças, jovens, mulheres e idosos.
Diretamente relacionadas à desigualdade sócio-econômica e como fonte de sua manutenção, estão as disparidades de uma educação desigual, as possibilidades desiguais ao lazer, à arte, à saúde, ao esporte, à produção científica, à possibilidade de produzir conhecimento próprio, de reconhecer e desenvolver a própria cultura, o próprio cotidiano; e as disparidades nas capacidades representacionais e comunicativas, organizacionais e de participação autônoma de comunidades, populações e povos em processos legítimos de tomada de decisões significativas para as suas vidas, ou seja, de poder político e institucional, gerando o enfraquecimento da democracia ou mantendo-a inócua.
Os modos de vida que não se adaptam ou não pretendem se adequar aos preceitos das agendas culturais e econômicas predominantes e suas imposições, sofrem violências impregnadas e estruturantes das suas sociedades, massacrados por guerras, genocídios, pelo racismo, machismo, homofobia, aporofobia em um momento de intensificação ou clarividência das disputas ideológicas, dos ódios, da intolerância religiosa, da decadência cognitiva, da decadência ética e de uma crise de valores que promovem o reforço dos conflitos culturais e de visões de mundo distintas, em detrimento da atenção e das cooperações necessárias para a superação dos desafios dos nossos tempos.
A interrelação entre esses distintos eixos de violência que se produzem, reproduzem e se reforçam mutuamente, torna ainda mais desafiadora a tarefa de abordá-los com soluções efetivas, objetivos factíveis, em rede e que levem em consideração a sua interconexão, a urgência e o impacto global de que precisamos.
Como resposta a esses dilemas globais, apostamos, aqui, em um caminhar que se ampara na constituição de uma Instituição sustentada em um novo paradigma de produção de conhecimentos e de práticas políticas, culturais, econômicas e sociais ancoradas nas demandas e nos desafios do cotidiano, seus territórios e suas gentes; no cuidado mútuo, na construção coletiva de sentidos, no coletivo, no fortalecimento de vínculos familiares, comunitários e institucionais; no exercício da solidariedade; no enfrentamento às relações desiguais de poder locais e de sua produção de injustiças; na busca pela compreensão compartilhada, em comunidade, sobre as realidades, o porquê das suas violências e como superá-las.
Esse processo local de produção coletiva de conhecimento, e que chamamos também de construção de justiça cognitiva, se conecta à sustentabilidade do planeta e em seus desafios; compreende a abordagem de tecnologias específicas como fundamentais para a superação da degradação do meio ambiente; no fortalecimento da democracia como um antídito à corrupção que impõe à maior parte das populações os seus interesses próprios e as ideologias que os mascaram; no reconhecimento de modos de vida que carregam solidariedades; no cuidado e; na abertura para conhecer, reconhecer e dialogar com as diversas culturas, os diversos saberes, as diversas formas de organização da vida e de atuação no mundo para a constituição de pontes e redes capazes de gerar força política para enfrentar os desafios que estão a nossa frente.
O OPOCA, paradoxalmente, em meio à tormenta global que nos afeta, aposta nessa sua utopia local, crítica, cotidiana, popular, concreta, possível, fundamentada no desenvolvimento da vida humana, cultural, ecológica e comunitária e na crença na pluralidade cultural, no diálogo horizontal, em rede, entre esses diferentes espaços, territórios, movimentos, pessoas, instituições, universidades, organizações internacionais, coletivos, governos, povos, comunidades que, em suas distintas frentes, criam alternativas políticas, sociais, científicas, populares, artísticas, econômicas, tecnológicas, culturais, dispostos também, cada um ao seu modo, a superar as violências e a constituir sociedades mais justas, solidárias e possíveis.
Siga as postagens ou acesse o documento completo.