Muros: Maria Francisca e IEAOU

A Oficina de Arte e Ativismo, que acontece semanalmente na Casa OPOCA, possui uma proposta de extensão na Escola Estadual Maria Francisca Deoclécio Arrivabene, assim, todas as quartas-feiras, desde maio de 2022, houve atividades mediadas por Débora Fernandes no clube juvenil de grafite na escola. Durante esses meses, atuamos para a criação de um grande mural no pátio, espaço de 53 metros quadrados que delimita a quadra esportiva. Trabalhamos por etapas, primeiro vimos um acervo de referências do muralismo, como: Os Gemeos, Eduardo Kobra, Basquiat, Banksy, Mag Magrela, Rimon Guimarães, Criola, Soberana Ziza, Daiara Tukano, entre outros. Após debater sobre as diversas maneiras de criar e as reflexões destes artistas, escolhemos o nosso tema que dialoga com todos eles: a diversidade cultural com foco em personalidades resistentes da cultura brasileira e do mundo. 

Parte do Mural da Escola Estadual Maria Francisca Arrivabene.

Adiante, iniciou a fase de elaboração do projeto, cada participante da oficina elaborou o seu protótipo do mural. Nessa fase fomos conversando e reelaborando as formas e ideias dos desenhos. Chegamos, então, à premissa de compor quatro núcleos, o primeiro com corpos negros, o segundo com corpos indígenas, o terceiro com corpos LGBTQIAP+ e o quarto com corpos de mulheres estrangeiras, todas pessoas que marcaram o Brasil e o mundo com suas histórias de luta.

Após todos finalizarem seus projetos, conversamos sobre cada um dos trabalhos, os participantes expuseram suas reflexões por trás dos desenhos. Surgiu, então, uma lista de doze personalidades para integrar o mural, são pessoas que reforçam a ideia de diversidade cultural, pois manifestam seus pensamentos e lutas em nossa sociedade. São eles: a escritora autodidata e negra Carolina Maria de Jesus, o geógrafo Milton Santos, a socióloga e defensora dos direitos humanos Marielle Franco, a artista e ativista transexual Matheusa Passarelli, o líder indígena e ambientalista Ailton Krenak, a líder indígena e política Sônia Guajajara, uma criança negra, uma jovem indígena Pataxó e uma mulher distante dos padrões sociais, por fim, na dimensão internacional escolhemos a artista mexicana e ativista das lutas das mulheres Frida Kahlo, a jovem ativista afegã que luta pela educação feminina Malala Yousafzai e a jovem judia que denunciou e foi vítima do holocausto Anne Frank. A princípio íamos fazer uma mulher girafa da comunidade Karen da Tailândia, elas utilizam argolas de metal no pescoço, porém, como não se sabe o motivo exato dessa tradição, consideramos prudente reavaliar, foi aí que trocamos pela Anne Frank.  

Na próxima etapa, Júnior Heitkoeter, artista e educador com experiência em muralismo, criou a unidade entre todos os desenhos para que pudéssemos conceber uma composição mais harmônica. Eu, Débora, fiquei responsável por criar o fundo, onde me baseei em relevos geográficos, pois aludem à composição geológica da terra e às tantas camadas culturais do mundo, assim, surgiram as montanhas em tons terrosos como base do projeto.

Projeto do Mural da Escola Estadual Maria Francisca Arrivabene.

Do dia 18 a 28 de novembro estivemos envolvidos com a criação do mural, traçamos as medidas no muro, o dividimos em quadrados de 1m conforme a escala e transferimos os desenhos, essa foi outra etapa com direcionamento do Junior Heitkoeter. Após desenhado todo o projeto no muro, começamos a etapa de mistura das cores, dividimos a tinta branca em pequenas porções para colorir com os pigmentos concentrados. No dia 22 de novembro, iniciamos a pintura que se estendeu até o dia 28 de novembro.

Dia a dia fomos pintando a grande extensão do muro. Por fim, o assinamos como criação do Coletivo CACAU.

Pinturas do Mural da Escola Estadual Maria Francisca Arrivabene. Fotos de Débora Fernandes.

Mural no IEAOU

No dia 28 de setembro, o Coletivo CACAU que compõe a Oficina de Arte e Ativismo se reuniu no Instituto Ecológico dos Artistas Orgânicos e Ultrassociais (IEAOU) em São Miguel Arcanjo/SP, para uma conversa acerca das iniciativas da entidade que giram em torno da permacultura e agricultura biodinâmica mescladas à arte, uma comunhão que valoriza as relações com a terra e o cultivo de comida de qualidade, tudo isso em íntimo contato e conexão com a Mata Atlântica. Fomos recebidos por Raphael Arcanjo e Marit Scheibe, agricultores e artistas idealizadores do projeto. 

O IEAOU está em fase de organização para o seu ato inaugural que envolverá produtores de frutas nativas, agricultores locais, artesãos, entre outros perfis. Para dar cara nova ao espaço, os idealizadores convidaram o Coletivo CACAU para fazer a fachada do Instituto. Com foco na criação do mural, nosso diálogo foi sobre as possibilidades de símbolos que iriam ser representados no projeto, em especial: as abelhas, o cambuci, a palmeira juçara e a figura do agricultor. 

Conversa no Instituto IEAOU.

Nessa mesma conversa, realizei a mediação de alguns trabalhos poéticos de Gustavo Caboco (https://caboco.tv/), artista indígena que une a arte e a terra. Ponderamos sobre as relações entre indígenas e a terra, entre produtores de alimentos e a terra, entre os elementos da natureza e a nossa vida. No final do encontro no IEAOU, nossos participantes foram convidados a degustar suco de cambuci, mel de abelha jataí e pipoca com milho orgânico e, também, participaram de uma roda de percussão corporal com o Raphael Arcanjo que é músico.

Trabalhos poéticos de Gustavo Caboco.

Adiante, nos dois próximos encontros da oficina, cada participante do CACAU se comprometeu a escolher, pesquisar e desenhar um elemento da Mata Atlântica para compor o mural. Em seguida, Junior Heitkoeter, artista e educador com experiência em muralismo, fez a junção dos fragmentos criando a composição final. O projeto final pode ser visualizado abaixo.

Projeto do Mural do Instituto IEAOU.

No projeto vemos o agricultor, a juçara, o cambuci, a abelha, a terra, as raízes, o sol e a água,  entre outros elementos importantes da Mata Atlântica. A pintura do mural começou em 29 de novembro, Raphael Arcanjo nos recebeu com suco fresco e uma boa conversa sobre sementes. Em seguida, fizemos a medição, escala e desenho no muro. No dia 30 de novembro iniciamos a pintura propriamente dita que se estendeu até dia 03 de dezembro. 

Pinturas do Mural do Instituto IEAOU. Fotos de Débora Fernandes.

Assim, com reflexões sobre conexão com a terra e a floresta, germinou o quarto mural do Coletivo CACAU.

Débora Fernandes

Débora Fernandes é artista-educadora, pesquisadora e fotógrafa. Mestranda em História da Arte pela Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP) e formada em Artes Visuais pela Universidade Estadual de Londrina (2017). Media a Oficina de Arte e Ativismo e é responsável pela Comunicação e Artes Visuais do OPOCA.

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